As crianças normalizam-se, nós não as normalizamos. Quando se compreende isto, o termo perde um pouco de seu peso esteriotípico e se torna uma ação nobre desenvolvida pela criança. É ela quem, sozinha e de forma autônoma, recupera seu equilíbrio interior e natural. Para fazer isto sozinha, no entanto, a criança precisa de nossa ajuda, especialmente no sentido de ser capaz de conquistar sua independência. Precisa de instruções sobre como fazer coisas, precisa de um ambiente adequado e precisa de adultos que a amem e respeitem.
O adulto é o facilitador da normalização. Ele não faz com que ela aconteça, e ele não é o responsável por ela acontecer. Mas ele cria as circunstâncias que permitem seu surgimento. Por um instante, pensemos na Universidade de Cambridge e em Isaac Newton. Pensemos em toda a estrutura da universidade e no infinito conhecimento que habitava seus muros quando, em 1687, Newton publica sua obra principal, "Princípios Matemáticos da Filosofia Natural", na qual introduz a Lei da Gravitação Universal. Evidentemente havia, dentro da Universidade, professores ímpares, uma bíblioteca bastante ampla e todo tipo de maquinário necessário a qualquer experimento da física.
E ainda assim, mesmo com todo o equipamento e todo o conhecimento, sem Isaac Newton, Cambridge não teria descoberto a Lei da Gravitação Universal e também teriam permanecido desconhecidas diversas outras leis desvendadas por Newton. Cambridge não é a responsável pelas descobertas, Newton é. Entretanto, foi só em Cambridge, com a estrutura física e psicológica da Universidade, que Newton foi capaz de levar suas descobertas a cabo.
O mesmo ocorre na sala montessoriana. Não se ensina normalização. Newton não descobriu a gravidade porque alguém lhe contou que ela existia, mas porque teve vontade e força de vontade para investigar até descobrir. No entanto, o ambiente o ajudou, como ajuda a criança, e as pessoas lá presentes eram as mais adequadas para acompanhá-lo em sua empreitada imensa.
Temos de guardar em mente, porém, que todo o trabalho de Newton ainda é menor, e de menor importância, do que o trabalho interior desenvolvido por uma criança que atinge seu equilíbrio natural e desenvolve-se plenamente. A criança precisa aprender, do zero, tudo. Newton precisou partir de algo para algo maior. Mas teve uma base sólida. Com a criança, mesmo esta base precisa ser criada a partir de três princípios: suas tendências inatas, o ambiente preparado e o professor.
Por ser a criança a grande responsável pela criação da humanidade e pela evolução da civilização, tudo aquilo de que ela precisar lhe deve ser provido, como se faz com um estudioso altamente especializado. E ainda, por sabermos que depende da reaquisição do equilíbrio natural da criança a imensa revolução de que nossa humanidade necessita, devemos ser incansáveis no aperfeiçoamento de nossas práticas e na preparação do ambiente, para que aquela que deve realizar o trabalho mais difícil possa fazê-lo com liberdade, alegria e paz.
Com esta mensagem, terminamos nossa sequência de quatro artigos acerca do processo de normalização da criança, e nos colocamos à disposição para todas as eventuais dúvidas. Continue seguindo nossos textos, pois ainda neste final de semana mais um será publicado. O tema é surpresa!